segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Próxima parada: Passagens Literárias

Final de sexta-feira na rodoviária de Curitiba, o dia lentamente começa a ceder espaço para a noite.  Viajantes por ir e vir amontoam-se na metade do estabelecimento que possui espaço para pessoas, próximo aos fundos da rodoviária; a outra “metade” desta está ocupada por maquinário e funcionários de uma reforma colossal, temporariamente reduzindo o espaço físico destinado ao trânsito de passageiros e ônibus.

O caminho para a parte interna, com seus bancos, pontos de venda e portões de entrada, é disputado, pois apressados cidadãos trafegam de e para todo lado – o que talvez tenha sido realçado por ser véspera de feriado, especificamente, 6 de setembro de 2013. Entre famílias que empilham volumosas bagagens em cantos a indivíduos solitários cuja carga é uma simplória mochila, ouve-se nitidamente a voz de motoristas que adentram pelo portão de embarque anunciando a próxima partida, logo sumindo em meio às vozes dos que aguardam a lotação e ao barulho de rodas de malas de viagem.

Eis que um som soma-se ao dessas, mas um olhar revela a particularidade de sua fonte. Um carrinho predominantemente amarelo, em cima do qual estão duas estantes de madeira, uma de costas para a outra, ambas recheadas de livros; “Passagens Literárias”, lê-se na placa amarela, acima das referidas estantes. Duas mulheres revezam-se conduzindo o carrinho no salão de espera, parando próximo aos passageiros. “Olá, estamos emprestando livros”.

Enquanto aguarda o ônibus, a pessoa pode emprestar livros gratuitamente. É um tempo no qual cabe um passeio pelas páginas das obras à disposição. Dos coloridos desenhos dos livros infantis (um exemplar de O Menino Maluquinho entre eles), as crônicas de Mario Prata ou os contos de Edgar Allan Poe, entre outras opções de viagem, o destino literário é livre, sem cobrança de embarque nem restrição de ida.

De autoria das funcionárias da Fundação Sidônio Muralha, o projeto acontece desde 2012. Entre 18h30 e 21hrs., nas sextas-feiras, elas levam as passagens literárias aos transeuntes da rodoviária. Após emprestarem um livro a alguém, o anota-se o nome deste, e o carrinho é levado adiante.


Quem empresta não precisa aguardar a volta das funcionárias caso queira trocar ou devolver o livro; e há pessoas que, ocasionalmente, preferem ouvir uma narração de conto ou crônica ao invés de ler. O destino e trajeto destas Passagens Literárias ficam ao gosto de quem viaja.

domingo, 8 de setembro de 2013

Voltando a Leitura

Durante alguns meses, fui estudante de um curso de fotografia, lecionado em uma escola no centro de Curitiba. Um ônibus e dez minutos de caminhada me bastavam para eu chegar ao destino. Avesso a atrasos, preferia chegar cedo, ainda que isso me resultasse em quinze ou vinte minutos de espera.

O que não me dizia nada. Minha ocupação pré-aula, sentado em um banco próximo a sala, era a mesma que durante o tempo dentro do veículo: um livro. Devido à prática, ganhei uma injusta alcunha. “Estudando de novo”, me disse a professora, mais de uma vez. Imerecida fama minha, e ingenuidade a dela. A menos que ela considere coletânea de contos do Marquês de Sade ou do Dalton Trevisan como baixaria fina – neste caso, arrisco-me a dizer que honro o adjetivo “estudioso”.

Talvez “absorto” sirva. Tão empolgado estava em determinada leitura, não necessariamente dos citados autores, que lia em pé no ponto de ônibus, dentro dos tubos que também caracterizam o transporte coletivo da metrópole. A lotação chegando, eu entrava e me encostava próximo a porta, quando não nesta, e voltava a ler assim que fechasse. A despeito do livro, não me concentrava a ponto de ignorar meus arredores, o que incluía freadas bruscas, entrada e saída de passageiros e gritos ou expressões verbais indiscretas destes, em especial uma dirigida a mim - “nossa, isso que é vontade de ler”. Um coletivo terrivelmente cheio, transitando lentamente debaixo de um sol escaldante, e um sujeito se punha a ler como se tais fatores não o afetassem. Por vezes eu observava pessoas lendo dessa maneira, noutras o visado era eu.

Houve capítulos, melhor, situações nas quais a prática me rendeu reações mistas. Em casa, eu com a mente e os olhos enterrados em um livro, e topava com alguma passagem que me era engraçada, eu ria. Quem estava perto me olhava com algo que de estranhamento. Mesmo não pedindo silêncio, talvez fosse esperado de mim, considerando minha absorção durante a leitura.


Entre olhares cujo significado variava entre “tudo bem aí?” e “alguém está se divertindo”, a melhor reação foi a da minha irmã caçula. Eu tinha me jogado em um sofá na sala, e voltei a ler, e ela chegou dizendo que ia interromper meu silêncio ligando a televisão. Eu lia, e ria. Ela me perguntou sobre o livro, ao que respondi que gostava tanto daquele em especial que lia uma vez por ano. A caçula me olha espantada, uma expressão de personagem de desenho animado tremendo de susto, e emenda: “acho que vou voltar a assistir”. Quanto a mim, voltei a rir- não do livro, mas da reação dela. Melhor deixar ele lendo antes que fale mais bobagem, não?